O morcego é o único mamífero que
voa e ainda bem. Eu, pessoalmente não gostava nada de me cruzar com um elefante
voador. Assim, e devido a esta característica, o morcego é um animal estranho
porque afinal voa mas não tem asas. Os membros anteriores e os dedos enormes,
unem-se por intermédio de uma membrana, e é com o auxílio destes “garfos” que
consegue voar. E voa bem.
Dormem de-pernas-para-o-ar,
embrulhados nas próprias “asas”, quase sempre durante o dia, escolhendo
cavernas escuras e húmidas, pendurando-se nos tectos como se fossem peras, e
não são cegos como se pensava, vendo até bastante bem. São tão estranhos, que
contrariamente aos outros mamíferos, não têm cinco sentidos mas sim seis.
Os morcegos emitem ultra-sons,
com o nariz ou com a boca, e recolhem os ecos dessas emissões, para conseguirem
assim calcular distâncias, voar às escuras ou capturar insectos de que se
alimentam, em pleno voo.
Eu sou um “morcego”.
De dia não produzo ou produzo
pouco, prefiro a noite. Durante a noite consigo ver as realidades. Gosto de
sombras e de como se misturam com as silhuetas meio iluminadas, com as
penumbras, como se destroem as cores e se criam os silêncios. De dia vejo
imagens lindas, sensuais, retocadas, repintadas, esculpidas, cheias de curvas,
torneadas pelo cinzel do artista, mas o que vejo de dia são máscaras, armaduras
que escondem os verdadeiros fantasmas, imagens falsas de nada.
De noite, a escuridão esconde
pinturas, maquilhagens, silicones, roupas, cores, brilhos e tudo fica pardo,
escondido, igual. Os silêncios ampliam os sons, o galho que se pisa, a folha
que escorrega da árvore, a brisa que arrasta aquela bola de papel. Estes sons
que a luz apaga, ouvem-se na escuridão, misturados com o bater das asas dos
insectos, com o canto da cigarra e do grilo, com o piar da coruja, formando
tantas melodias aterradoras para os desconhecidos.
De noite oiço, de noite cheiro,
de noite toco, de noite apalpo, de noite cerro os olhos para ver melhor. De noite
sinto os teus lábios, penetro a tua boca, encontro a tua língua onde me enrolo.
Sinto os teus seios em cada mão, os mamilos, hirtos, que percorrem os
intervalos dos meus dedos, a cintura que ondeia ao som da melodia que nos
juntou, sinto os ventres que se procuram.
Sinto, e por maior que seja a
escuridão, mesmo que os nossos olhos estejam fechados, mesmo que as vestes
estejam amarrotadas e espalhadas pelo chão, os corpos estejam suados, cansados,
enrugados, não existem máscaras, a maquilhagem esborratada misturada com o batom
que os lábios lamberam de paixão, nada disto interessa, porque o que vemos é a
verdade que de dia se esconde, e na noite cresce envolta nas “asas” de morcegos
como nós.
2 comentários:
Adorei!
Gostei muito disso: "De noite oiço, de noite cheiro, de noite toco, de noite apalpo, de noite cerro os olhos para ver melhor. De noite sinto os teus lábios, penetro a tua boca, encontro a tua língua onde me enrolo."
Obrigado.
Só podia ser assim... porque sou um morcego!
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