domingo, 10 de março de 2013

Lembrei-me do dia dos teus anos



Trovoadas…

Ouvi um estrondo enorme, um estrondo que fez estremecer as minhas janelas, que abanou as vidraças. A trovoada tinha-se aproximado sem sequer me aperceber, já que estava entretido a escrever outras coisas, e nesses momentos é difícil notar o que se passa à minha volta.

Levantei o estore de ripas, mesmo ao meu lado. A noite estava completamente negra. Caía uma chuva miudinha que mal se via, a apenas a notei porque escorria pelos vidros. Fiquei ali a olhar para nada, porque estava tudo parado, tudo calmo, tudo a descansar na madrugada.

Lembrei-me do chispar dos raios no horizonte, quando à minha volta só havia mar, um enorme mar de água sem fim, negro, rugindo em surdina, pronto a atacar os mais incautos ou atrevidos. Lembrei-me de como tudo se iluminava, como se fosse dia e, depois, do aproximar, do rolar do trovão, como se viesse do fundo do mar.

Adoro trovoadas… gosto mesmo de assistir às fúrias da natureza.

De repente, fez-se dia, um enorme clarão mesmo diante de mim, e ainda piscava os olhos e o estrondo voltou a abanar tudo e a deixar-me os tímpanos a vibrar.

O que eram apenas sombras, contornos mal definidos, ganharam forma, ganharam cor, apareceram por momentos, apagando-se depois como se escondidos pelo trovão enorme.

A chuva aumentou, começou a cair com toda a força, como se o céu se tivesse rasgado com o último estremeção, e os rios junto das valetas engrossaram, arrastando as últimas folhas que o vento tinha arrancado das árvores nuas. Grandes lagos se formaram, porque as sarjetas não conseguiam engolir tudo o que caía.

Então lembrei-me de como chovia naquele dia. Nos sapatinhos azuis que tentavas não molhar enquanto íamos evitando os lagos que nos apareciam pela frente, teimando em fechar-nos todos os caminhos. Lembro essa chuva e como te assentava bem o vestido que se antevia do casaco entreaberto. Lembro-me de sentir a tua mão que apertava a dobra do meu braço e te ajudava a manter o equilíbrio no andar passo a passo, devagar. Lembrei esse dia especial, especial para ti e para mim. Lembrei em cada relâmpago um momento, uma loucura, uma conversa, uma gargalhada. Lembrei-me da despedida…

As trovoadas têm este efeito em mim.

Sim lembrei-me do dia dos teus anos. E não pude deixar de te dizer.

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