A Savana mantém-se calada. A Savana faz do seu silêncio, a sua mais temível arma. A Savana usa o silêncio para adensar o seu mistério, para proteger os que a protegem, para ameaçar os que a desafiam ou ignoram. A Savana esgrime no seu silêncio todas as armas, prepara todas as suas armadilhas, demonstra a força da sua própria força, troca todos os sentidos.
Na Savana não se ouvem as asas das borboletas, queimadas que foram por tantos sóis impiedosos, não se escutam os trinares de rouxinóis nem o grasnar do corvo, porque nem este resistiu à dureza dos troncos que o desafiaram, o rugido do leão silenciou-se porque aqui não existe reinado e as leoas não gemem nos seus cios, o piar das águias afastou-se para bem longe nos voos picados das presas esbaforidas.
A Savana falou no seu silêncio, avisou todos, mostrou que nesse silêncio podiam ouvir-se, que no silêncio podiam aprender todos os segredos, conhecer todas as verdades, desmascarar todas as mentiras, ouvir o gritar dos troncos quebrados em cada tropel, enxergar odores de cada presa escondida por detrás do abrasador horizonte ondulante.
O vento que a assolava, soprava calado o calor que tudo abrasava, os cascos ficavam colados nas próprias pegadas, a poeira assentava nas pelagens suadas, as ervas ondulantes não se tocavam nas suas danças, as pedras mantinham-se onde tinham sido semeadas, as árvores permaneciam esculpidas em cada tronco oco.
Depois do silêncio da Savana ouvem-se melhor todos os silêncios, ouvem-se os olhares furtivos, ouvem-se os respirares apaixonados, ouve-se o dar as mãos, ouvem-se as sombras que mostram a sua frescura, ouvem-se os beijos que se prometem, ouvem-se cheiros, ouvem-se cores, ouve-se a morte que não se anuncia, ouve-se o medo de cada presa, ouve-se a fome dos predadores, ouve-se a sede dos que desconhecem o charco de água barrenta e mal cheirosa, ouvem-se as pegadas de quem partiu.
Depois do silêncio da Savana, volta a ouvir-se o silêncio de quem quer permanecer.
#2120
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