Por aquela enorme planície verde,
corriam caminhos, serpenteando por sobre o tapete macio, desviando-se de cada
tronco, de cada tufo de floresta que se avistava por ali. Por vezes largos,
estreitavam-se nas curvas, como se avisassem que ali era preciso abrandar,
virar com cuidado para com nada esbarrar.
As pedras que se avistavam,
solitárias, perdidas no meio do verde, às vezes juntas em pequenos grupos, não
ameaçavam os trilhos, demasiado pisados para que as chuvas invernosas os
amolecessem.
Contrariando essas certezas,
porque era assim a sua natureza, o Lobo nunca seguia os caminhos que outros
haviam percorrido, nunca pisava o chão já espezinhado, não seguia os mesmos
rumos por mais seguros, abertos, claros. Nunca o faria porque não queria,
porque o caminho indicado não lhe servia, não o satisfazia. Ali não existiam
desafios, nem perigos, as surpresas eram coisa impensável nos carreiros
definidos.
O Lobo preferia o desconhecido, o
desafio escondido na erva alta que o cobria, o improvável espreitava,
construído de tantas armadilhas, de sons, de choros, de vozes que da surdina se
ouviam, de piares, de passos abafados, de tocas e buracos, nunca se sabia,
nunca se via, nunca se pressentia.
Mas nesse labirinto sem norte
surgiam borboletas que o deslumbravam, outros lobos que o desafiavam, lutas que
não recusava, flores, belas flores que interpretavam melodias com seus
perfumes, quebravam o verde das ervas com tantas cores, e fêmeas, lobas lindas
que o espreitavam, que o desejavam, que tantas vezes o satisfaziam ou se insinuavam
e depois fugiam. E o Lobo gostava!
O Lobo gostava, o Lobo recordava
a bela Loba Branca. Fazia tempo que não a farejava, escondida que estava porque
assim o queria, decerto abrigada na sombra, protegendo o pelo luzidio que
vestia. Só aquela Loba o fazia regressar ali, para recordar tudo o que por ali
se vivera, tudo o que juntara em seduções, eu lutas, em sangue que escorrera,
mas também nas correrias, nas brincadeiras, no que partilhavam para se
defender. Os olhos conheciam-se, cruzavam-se, trocavam-se, entendiam-se,
enquanto tanta coisa os unia. Era uma união que valia nas lutas que travavam,
que os ajudava, que lhes dava novos alentos, que lhes oferecia horizontes de
mel pintados.
Era o cheiro que o trazia.
Era pura nostalgia.
Lembrava tudo, via tudo, nada
esquecera, nada esqueceria porque o marcara, as cicatrizes demonstravam-no e
como o demostravam.
E no meio da erva alta ouviu uma
voz que cantava. Do meio da erva alta escutou um sorriso. No meio da erva alta
ouviu mas nada viu.
Então o Lobo uivou, uivou duas
vezes e seguiu.
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