O poeta é um mentiroso.
Não conheço nenhum poeta digno de
tal nome que não seja mentiroso. Camões, Bocage, Pessoa, Vinícius, Ary, não passam de
grandes mentirosos, compulsivamente mentirosos, perfeitos mentirosos que nos
enganam em cada palavra, em cada rima dos seus poemas. Só por serem enormes
mentirosos lhes foi reconhecido o direito de se chamarem poetas.
O poeta mente com quantos dentes
tem na boca, nada do que diz ou escreve é verdade, não pode ser verdade, é
impossível que seja verdade, porque não existem amores assim, não existem dores
assim, não existem gentes assim, não existem deuses assim, não existem credos
assim.
O poeta é mentiroso porque para
se ser poeta é preciso amar, é preciso sentir um grande amor, ter um grande
amor, ser parte de um enorme e avassalador amor, mas o poeta não ama, sim o
poeta não ama, nunca amou, nem nunca amará, porque o poeta é incapaz de amar, o
poeta é incapaz de se apaixonar, o poeta é incapaz de dar de si, dos seus
sentimentos, porque afinal o poeta nada sente, nada pode sentir, e se sentisse
morria.
Mas se o poeta não ama, se é
incapaz de tal sentir e, se para se ser poeta é preciso amar, como pode ser
então poeta? O poeta não ama, o poeta finge que ama, mente quando diz que ama,
fala do amor que sente, escreve sobre o amor que o inflama, mas quando escreve
mente e então todo o amor se transforma em mentira, deixa de ser seu, passa
para o poema, foge, deixa o poeta sozinho sem amor.
O poeta conta o que vê, ou que
pensou ter visto, conta as verdades que lhe mostram, mas as verdades que se
mostram são sempre mentiras que pusemos ali para enganar os poetas. E os poetas
contam essas mentiras que não são suas, e a essas juntam as suas, as que
cantaram no último verso escrito, construindo uma mentira maior.
O poeta não diz nunca a verdade,
porque a verdade é dura, a verdade magoa, a verdade dói bem fundo nas almas, e
se a verdade inundasse os seus poemas quem os leria, quem quereria enfrentar
uma verdade dura e sofrer? Ninguém. E o poeta não pode dar-se a esses luxos de
ninguém o querer ler. O poeta adora ser admirado, o poeta adora a adulação,
mesmo que a adulação e a admiração sejam mentira, porque afinal o poeta está
habituado a conviver com a mentira, porque afinal o poeta é mentiroso.
Mas a verdadeira habilidade do
poeta, aquele dom que não é para todos, aquela enorme qualidade que é preciso
ter-se para se ser poeta, é a de mentir tão bem, proteger tão bem a mentira,
pintar a mentira de cores vivas, inundá-la de luz, conseguir cegar quem visitar
os seus poemas, e de tal maneira as mentiras são poderosas, são credíveis, sem
falhas, que todos acreditam no que diz.
Sim, não tenho nenhumas dúvidas,
estou absolutamente certo de tudo o que disse, o poeta é mentiroso, precisa ser
mentiroso, é absolutamente necessário que seja mentiroso para que se chame
poeta.
E se todos vocês que aqui
chegaram e me leram, e também acreditaram, então…
Chamo-me Poeta!
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