Na escuridão da noite, deste Verão incerto, estava frio, um frio pequeno como o Verão que mal se sentia e até chovia, gotas envergonhadas pela brisa que as trazia do céu até mim.
Percorri ruas desertas, com carros alinhados, serpenteando pelo alinhar do passeio de pedras brancas, luzidias de tantos pés, agora arredados dos seus percursos pelo frio da noite, pela chuva envergonhada, pelo medo da escuridão.
As sombras misturavam-se, juntavam-se com a minha, que teimava em ficar pisada debaixo dos meus pés, ás vezes atrás de mim, e não a via, outras a meu lado como fiel companheira, outras ainda a defender-me porque em precedia, enquanto a olhava arredia.
E a noite crescia, alimentava-se da sua própria escuridão, dos silêncios de bocas entreabertas, dos brilhos baços de olhos sonolentos, do calor do desejo dos abraços dos amantes, das palavras surdas murmuradas pelos apaixonados escondidos em quartos de hotel, pelos gemidos da mulher violada, pelos passos nos caminhos percorridos, pelo calor das mãos que se dão. A noite crescia.
Mas a noite não me deixou sozinho percorrendo as suas calçadas, a noite abraçou-me num olhar, mostrou-me um enorme sorriso de lábios vermelhos, fez-se acompanhar por uma rosa, fez soar a melodia por que ansiava, mostrou-se luz.
Então, a noite amanheceu.
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