A mentira deste primeiro?
Sempre há cada coisa!
Às vezes na vida andamos perdidos, meses, anos, sem vermos o caminho, sem conseguirmos uma única vitória, perdendo os sonhos de vista, mesmo quando neles investimos tudo o que temos, sem desistir, lutando a cada segundo.
Sentimos a dor de cada silêncio, o peso de sermos ignorados, mesmo gritando muito alto o que sentimos, e nada conseguimos, apenas ouvindo o eco da nossa própria voz.
Fazemos tudo o que devemos fazer, tudo bem feito, somos sérios, verdadeiros e nada. Mas quando menos esperamos, quando já fartos de tantas dores, estamos prestes a desistir, deitando tudo para trás das costas, esquecendo o que durante tanto tempo oferecemos, acontece qualquer coisa que sempre desejámos, assim, de repente, nascendo de uma improbabilidade qualquer, quantas vezes reflexo de coisas estúpidas que fazemos mesmo sem querer.
Ontem, já ao fim do dia, decidi enviar-lhe um SMS. Estava cheio de saudades, com uma vontade louca de a abraçar, de lhe sussurrar ao ouvido o que sinto, como a amo, como me sentia fraco, como precisava dela. Não podia ser um SMS qualquer, tinha que ser diferente, algo que a fizesse sorrir, que lhe desse vontade de sacrificar um pouco do seu dia para nos encontrarmos.
Depois de alguma pesquisa, encontrei uma fotografia que tinha escrito, em letras bem grandes, a seguinte frase - «POSSO CONVIDAR-TE PARA BEBERMOS UM CAFÉ?» - e depois em letras muito pequeninas dizia - «ou posso comer-te sem gastar dinheiro?».
Escrevi o texto de um MMS com um única palavra - «Responde», anexei a fotografia e enviei-o.
Passado meia hora recebi a resposta porque não esperava:
«Vem ter a minha casa».
Nem estava a acreditar naquilo, nunca me tinha convidado para ir ter com ela a casa, o que estava a passar-se, estaria eu a imaginar coisas? Meti-me no carro, e os trinta quilómetros pareceram-me poucos, embora chovesse e o chão estivesse perigosamente escorregadio. Cheguei num piscar de olhos.
Bati á porta e quando abriu, fiquei ali a olhá-la, calado, como se todas as palavras me tivessem fugido, completamente desorientado, com a imagem que estava ali, á minha frente, linda e sensual. Foi preciso agarrar-me na mão e puxar-me para dentro. A porta fechou-se por detrás de mim, selando o mundo de sonho que estava ali, perante os meus olhos.
Num impulso abracei-a, abracei-a como talvez nunca tivesse feito, como se fosse a primeira e a derradeira vez, um abraço enorme, quente, apaixonado. Os olhos procuraram-se, cruzaram-se, sentiram-se, e o silêncio confessou um desejo maior, escondido, recalcado por tanto tempo, pronto a inflamar-se, a consumir-se. Surgiu o beijo, interminável, sôfrego, violento, mas escaldante, fazendo crescer a emoção, inflamando o momento.
E aconteceu, aconteceu surgindo do nada, sem palavras, sem juras, sem promessas. Aconteceu, de repente, não sei bem onde, nem quando, nem como. Aconteceu e repetiu-se outra vez, sem voz, sem palavras, sem conversas, no silêncio de dois animais carentes, esfomeados, no cio desesperados e saciados.
Foram quatro horas em que o relógio parou, quatro horas mudas (como foi possível?), em que demos tudo, aproveitamos tudo o que recebemos, como que envergonhados do que sentíamos, como se estivéssemos a pecar, a cometer um crime.
Quando saí, despedi-me com um beijo, e voltámos a não ser capazes de dizer nada.
Nem um «Até amanhã».
Cheguei agora e ainda estou mudo e atordoado.
E este foi para baralhar
Todos os dias aqui deixo qualquer coisa, por vezes mais que uma vez por dia, com verdade, com sinceridade, de maneira transparente e clara. Mas também já disse aqui que a escrita não é só isso, porque se fosse apenas isto, pouco adiantava. Já aqui disse e já escrevi, que o poeta não diz tudo, não escreve tudo, e que as suas verdades não são iguais às verdades de quem o lê, residindo aí o mistério, a beleza de cada interpretação, do ler nas entrelinhas, de criar as suas próprias verdades, desvendar os seus próprios mistérios.
Já vos disse para não acreditarem em tudo o que escrevo, embora seja tudo verdade, que muitas vezes podem parecer mentiras, mas que não são.
Hoje é dia 1 de Abril, o dia das mentiras. Hoje é o dia em que se mente sem ser criticável, mentiras que não se julgam, «mentiras de brincadeira», inocentes, confessadas, que não provocam danos, apenas pelo prazer de enganar.
Hoje também menti, ou vou ainda mentir, ou estou neste momento a mentir, para vos enganar, para brincar com estes Especialíssimos, exactamente porque o são e apenas por isso merecem que o faça, embora deteste a mentira.
Hoje escrevi muita coisa, publiquei muita coisa, disse muita coisa, estou ainda a dizer muita coisa, e entre todas as coisas escritas e publicadas por mim hoje, poderá existir uma mentira, ou talvez até ainda não haja nenhuma mentira, e essa mentira poderá ainda aparecer aqui, neste que agora escrevo, ou ainda poderá acontecer que a mentira seja, eu estar a escrever que há uma mentira, e afinal não existir mentira nenhuma e ser essa a própria mentira.
Até chegar a meia-noite é tempo de mentira, e não sei se escreverei mais até lá, por isso, a qualquer momento, poderá acontecer, ou talvez já tenha acontecido, ou talvez nem aconteça que ela surja.
Mas atenção, muita atenção, poderá parecer fácil, poderá até parecer que a mentira seja o facto ou factos, mais inverosímeis que tenha relatado. Não vão por aí, assim não chegarão a lugar nenhum, não vão descobrir.
E para terminar o que aqui escrevo, explicando melhor para que não haja dúvidas ou más interpretações do que disse, porque é um bocadinho complicado, tudo o que escrevi, estou a escrever ou ainda escreverei é verdade, apenas verdade e só a verdade.
De qualquer maneira, apresento aqui as minhas desculpas de vos mentir.
Sem comentários:
Enviar um comentário