Tempo, sem tempo.
É discutível... mas eu sou discutível... é ameaçador... mas eu sou ameaçador... é óbvio, mas eu sou óbvio... é uma loucura... mas eu sou louco. Felizmente sei que também és tudo isto, muito mais do que eu... por isso te entendo... por isso te quero tanto.
Este aqui, sou eu.
Dia, noite, dia, noite e a sua sucessão marca o nosso ritmo, o ritmo de alguns, de uma maioria que o cumpre religiosamente… trabalho, descanso, trabalho, descanso, cheio de horas, cheio de minutos, cheio de segundos, cheio de intervalos e continuações, sempre iguais, no ritmo, na imaginação, na rotina que nos impõe a vida.
Respeitando este frenesim de perfeição relojoeira, consumimos, produzimos, consumimos, produzimos, só para respeitar este frenesim de perfeição relojoeira. E é sempre preciso respeitar este frenesim de perfeição relojoeira para que funcione, para que não se interrompa, para que não pare e a perfeição relojoeira se cumpra, na eterna sucessão de dias e noites, dias e noites.
Ao fundo do cenário, como que disfarçado, por entre os adereços, está o culpado desta escravidão, deste abuso, desta submissão colectiva, desta verdadeira obsessão de cumprir a todo o custo, de se ser perfeito que baste (ou que chegue). O culpado de tudo isto, não é vida, não é corpo, não é alma, é, não sei, é talvez, é agora, é ontem, será amanhã, e de todas as definições que tem, nenhuma lhe serve, porque quando terminada está, já é velha, já passou, é preciso redesenhar, redefinir, reescrever, reinventar… O culpado, o todo poderoso, o invencível, chama-se TEMPO.
Mas não o tempo não passa, o tempo não envelhece, o tempo não se gasta, o tempo não acaba… o tempo não tem princípio, nem meio e, muito menos fim.
Quem passa somos nós, passamos por ele devagar ou a alta velocidade, ora alegres, ora tristes, por vezes sós, muito sós, outras não, porque arrastamos connosco alguém que nos ajuda a por ele passar.
O tempo é, e sempre será igual, segundo-a-segundo, minuto-a-minuto, hora-a-hora, deixando-se pintar com as cores que quisermos, com as melodias que desejarmos ouvir, no nascer e no morrer, na paixão, no amor, na solidão, na solidão, sim, sim, nessa solidão e porque não em toda a saudade, no nascimento ou na maternidade, no crescer a aprender, no andar, no andar.
Cada um de nós vê o tempo, sente o tempo, consome o tempo, desperdiça o tempo, brinca com o tempo, esquece o tempo. Quando se é jovem pensa-se que temos tempo, tempo para tudo, queremos viver o nosso tempo… Depois, com o tempo, começamos a olhar, a observar, e usamos o tempo para querer, para sonhar… mas vamos passando pelo tempo, e o tempo ensina, o tempo é escola, universidade, e quando menos esperamos, ensina-nos a maior lição, a mais dura, a mais dolorosa de todas as lições.
Todos, crianças, adultos, velhos, estão segundo-a-segundo a viver o fim-do-seu-tempo. Todos sem excepção, estão no limiar da vida, passando pelo tempo com o sonho único, igual, de que o tempo depois não acabe, para que possa haver um pouco mais de tempo. Ninguém tem amanhã, ninguém tem logo, ninguém tem depois, porque o tempo não promete.
Eu não tenho tempo, não o meço, não o olho, não o saboreio, não o uso, aproveito-o, vivo-o.
O que me contaram sobre ele, esqueço, as suas ameaças ignoro, não perco tempo com o tempo. Eu sei que estou no fim do meu tempo, como o bébé que ali a mãe amamenta e mal abre os olhos. De que me serve comparar-me contigo, se estamos os dois no fim?
O que quero apenas, o que vivo apenas, o que sinto, pelo que luto, pelo que sofro, por tudo o que tenho, por aquilo que recordo de ter passado pelo tempo, o importante é o agora e por isso te trago para aqui, por isso te abraço aqui, por isso te beijo e amo aqui, com toda a força, oferecendo-te tudo, sem te pedir, sem te avaliar, porque não quero perder tempo, quero viver este segundo, este mesmo agora, e sentir a grande felicidade de te adorar sem tempo, só e apenas, porque eu, porque tu, porque agora, estamos os dois no fim do nosso tempo.
E quando este segundo terminar, e eu e tu tivermos outro segundo do fim do nosso tempo, voltarei a fazer tudo igual, e voltarei também a esperar, ter outro segundo do fim do nosso tempo, SÓ PARA NÓS.
2 comentários:
"Tempo"é um tema que muito me agrada, muito me assusta, muito me inspira, e muito me faz falta.
Adorei me encontrar dentro do "Teu Tempo", me identifiquei muito com teu texto.
beijos
Já imaginava que este "TEMPO" se encaixa-se no teu "TEMPO".
Se procurares vais encontrar por aqui muitos "TEMPOS", todos diferentes, porque é um tema de que gosto particularmente.
Obrigado por vires aqui consumir o teu "TEMPO".
Beijos.
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