sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Um tempo de altos e baixos


O tempo é plano, completamente plano, sem ressaltos, sem novidade, sem sonhos, sem aspirações e, cada segundo que nasce, outro trucida, sem resistir ao que se lhe seguir. O tempo é plano porque não há minutos, nem horas, nem dias, meses ou anos. Não se nasce num minuto, ou numa hora, nasce-se num segundo, apenas num segundo e morre-se noutro. O tempo é plano, porque todos os seus segundos são iguais, no tamanho, na cor, na melodia, no ritmo que alguém marcou, ficando para sempre presos, na teia apertada da falta de imaginação.

O tempo que passa por mim também é plano, mas não quero saber. Ignoro esse tempo, porque o relógio há muito perdeu os ponteiros que tinha, durante um vendaval que me atingiu e os dobrou, enleou, enquanto cada um puxava com seu ritmo, um ritmo diferente do que o tempo marcava. E caíram.

Ignoro esse tempo, porque na ampulheta a areia deixou de correr, quando o seu vidro chocou com a pedra que arremessei, espalhando cada grão que o vento levou e semeou. Esse tempo também não passa no meu relógio de sol, onde a sombra se esquece de viver, na falta do fiel que se perdeu quando nele tropecei.

Ignoro esse tempo, porque no meu relógio de água, os alcatruzes congelaram, no passar de tantos invernos em que o frio arrefeceu estas mãos. A esse enorme frio nem a clepsidra resistiu. Até o de fogo se consumiu e ardeu, em cada uma das esperanças que não venceu.

Ignoro esse tempo plano, mas mesmo plano, o tempo passa por mim, em torrente, onde os segundos repintam a cor dos meus cabelos, amolecem a força dos meus braços, afastam as imagens dos meus olhos, baralham as letras de cada verso fazem as vírgulas parecer pontos, transformam oitos em três ou com sorte, em seis, se calhar. Os zeros, esses, não existem no tempo, por isso não há perigo se os encontrar.

Eu tenho um tempo que não é plano. O meu tempo não tem segundos. O meu tempo tem momentos que duram segundos, que consomem segundos, que juntam segundos, qua fazem cada segundo valer a pena.

Cada momento tem uma cor, uma nota de música, uns olhos, uma mão amiga, o calor de um desejo, a força de uma lágrima, a dor de uma perda, a ânsia de uma paixão, o desespero nascido de um ódio, a fúria de cada injustiça.

No meu tempo de momentos há dor e felicidade, há paixões e desilusões, há nascimentos e mortes, há gritos e silêncios, ruídos e melodias, chove quando o sol se esconde, há amor sempre que o gelo se derrete, há tudo o que preciso para preencher cada momento.

O meu tempo não é plano. Eu tenho um tempo diferente, um tempo de altos e baixos.

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